2 de janeiro de 2010

travesseiro

Entre as declarações, discursos e até mesmo conversas com meu travesseiro, onde já representamos as mais diversas relações, poucas vezes cheguei a dizer "eu te amo", e isso só aconteceu em momentos de inércia, em que me desconcentrei devido à música ou ao sono, ou quando quis transformar a cena em uma tragédia repleta de exageros. O fato é que ali, encarando meu inofensivo travesseiro, consigo pensar plenamente, dar nomes às sensações, elaborar bem as idéias, dizer o que realmente quero.

É raro que um momento de reflexão que não seja interrompido no meio resulte em amor. Denomina-se amor o que não tem nome ou explicação, algo como a fé, que é tida como inquestionável. Pode-se dizer que são tão inquestionáveis porque provêm ambos da dúvida, quando são questionados, deixam de existir e transformam-se em outra coisa. Só se diz que ama quando não se tem claro outros motivos para querer.

Abraço o travesseiro bem forte e depois o atiro longe ao dizer que o amo. Então seguro-o e elaboro outra frase, filosofo sobre algo ou leio para ele algum trecho de romance, então fico em paz comigo mesma e considero claros meus sentimentos em relação ao que representa o travesseiro.

Agora, quando após um inerte "eu te amo", atiro o travesseiro longe e passo a encará-lo, sem palavras, dominada por uma inércia de pensamentos mais forte que tudo, sem achar nada mais racional a ser dito, deixo-o ali onde caiu e vou fazer outra coisa, completamente angustiada. Só fazemos as pazes inevitavelmente na hora de dormir, quando ele volta magicamente a ser um travesseiro inofensivo e fofinho, nada além disso.

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