27 de janeiro de 2010

Gardel e o calor

-Se eu tivesse alguém por quem ficar, eu teria mais um motivo para ir embora.

G.H. já sabia que eu diria algo do tipo quando mencionou certo alguém.

-Do que estamos fugindo exatamente? - me pergunta ele, enquanto escolhe um CD para ouvirmos. Estamos sós, lá fora faz muito calor.

-Não digo que fugimos, digo que estamos procurando nós mesmos cada vez mais, somos muito intimistas - respondo, olhando pro teto branco do quarto - Está certo, acabamos fugindo do que está além de nós, da realidade, do mundo lá fora.

Ele escolheu Gardel. G.H. adora tangos. Senta-se na beirada da cama e pega minha mão.

-Realmente. Faz mais de 3o graus lá fora e aqui dentro suas mãos estão geladas.

Ele esfrega minhas mãos.

-Há tanto que explorar em nós dois, não precisamos sair, lá fora está calor e trânsito, aqui está fresco, tem comida e toca tango - digo, tirando minhas mãos das dele.

-A comida vai acabar, minha querida.
-Vamos comprar mais, sem traumas.
-O dinheiro vai acabar também.

Silêncio. G.H. as vezes é um bocado irritante.

-Mas não acabou, agora fique quieto, vamos ouvir o CD, depois podemos tomar sorvete ou deitar no chão gelado da cozinha, aqui dentro está começando a esquentar e isso me parece terrível.

-É inevitável - conclui G.H. e faz-se silêncio entre nós.

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