Tocava jazz nas caixas de som. A banda não começara a tocar, estava cedo e apenas nós estávamos naquele lugar abafado e mal-iluminado. Eu numa poltrona, meio torta, devorando um sanduíche, ele na outra, sentado, me observando, tomando uma cerveja. Entre nós, uma mesinha e muito mais.
Ele pegou minha bolsa, encontrou um pequeno caderno, abriu. Eu acabara o sanduíche e olhava para o quadro cubista da parede, ouvindo a música.
-Sua letra não parece de menina.
Normal. Ela é feia, meio corrida, de forma.
-Nunca vi sua letra - comentei - É Mingus isso que está tocando?
-Sim - e disse o nome da música, que hoje não me lembro.
Fazia calor e eu fechei os olhos, ouvindo a música, que parecia se contorcer toda pra sair da caixa de som, chegava até os meus ouvidos toda retorcida e aquilo era perturbador, mas bonito.
Quando abri os olhos, ele tinha minha lapiseira na mão e estava prestes a rabiscar algo no caderno.
-Minha letra é parecida com a sua, olha só.
Escreveu algo e passou o caderno para mim.
"Por que me descobriste no abandono?" foi o que li.
-Realmente, é como se eu mesma tivesse escrito.
Fechei o caderno.
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